🥕 Comprar casa vs Alugar casa - dilema resolvido?
Toda a gente passa por este dilema pelo menos uma vez na vida. Descubram neste artigo como pensar nesta decisão e aquilo que realmente importa depois de a tomar.
Olá a todos e bem-vindos a mais um artigo d’O Amador Financeiro 🥕
Nota antes de começar: o conteúdo neste artigo não é aconselhamento financeiro.
Posto isto, vamos lá!
Quando voltei para Portugal com a minha namorada, uma das primeiras coisas que fizemos foi procurar uma casa para alugar. Estivemos mais de 3 anos em Londres sempre a alugar casa. Logo, alugar casa em Portugal foi algo automático para nós.
No entanto, para nosso espanto, encontramos mais dificuldades do que em Londres. Os nossos salários passaram a ser mais baixos e, embora as rendas sejam mais baixas, não o são proporcionalmente. Em Londres, o que pagávamos de renda mensal representava 31% dos nossos salários líquidos. No Porto, as rendas que vimos representavam 40%. Para além disto, a oferta que encontramos foi muito reduzida.
Aceitamos as perdas (ganhamos na comida e no clima) e tentamos na mesma alugar pela flexibilidade que queríamos ter. Fomos ver cerca de 10 apartamentos diferentes e fizemos oferta a 2 deles. Ambas as ofertas foram rejeitadas pelo mesmo motivo “Ah desculpem, vamos alugar a um estrangeiro que vai pagar mais 100€ por mês do que o anunciado e pagar 12 meses de uma vez só.”
Ficamos chocados e extremamente frustrados. Não só já estávamos a pagar mais do que o queríamos como ainda tínhamos que entrar em guerras de preços. Isto foi a gota de água depois de meses à procura. Foi então que pensamos “E se comprássemos um apartamento em vez de alugar? De certeza que a prestação ao banco não vai ser tão alta como os 900€ de renda que nos andam a pedir por um T1.” E não era, mesmo com as atuais taxas de juro altas.
Mudamos então o chip de alugar para comprar. Parece-vos uma decisão perfeitamente válida e justificada com lógica financeira, certo? Qualquer um pensaria o mesmo. No entanto, quanto mais exploramos a hipótese de comprar, mais percebemos que não era assim tão simples.
A odisseia de comprar uma casa
A primeira grande diferença entre alugar e comprar uma casa é o peso emocional e psicológico. Quando começamos a procurar casas para comprar, reparamos que a importância dada a cada pormenor foi maior do que quando a alugar. Comprar requer um investimento muito maior, pedir um crédito ao banco (na maioria dos casos) e efetivamente ficar com a responsabilidade do imóvel. Por isso, é normal perder-se muito mais tempo à procura e ser-se mais seletivo.
Para além do tempo gasto à procura ser mais elevado, as coisas ainda se complicam mais após encontrar a tal. Comprar uma casa envolve muito mais burocracias, pessoas e processos do que alugar. Vou assumir que há um crédito à habitação a pedir por ser o mais comum em Portugal:
Lidar com vendedores e/ou imobiliárias.
Garantir que os documentos do imóvel estão atualizados.
Garantir que o imóvel ou o prédio não traz surpresas inesperadas.
Falar com vizinhos e administração do condomínio para obter mais informação.
Pedir propostas a vários bancos ou intermediários de crédito para escolher o melhor.
Responder às exigências do banco em termos de documentação.
Lidar com a lentidão e incompetência de bancos (perder bastante tempo presencialmente em balcões, em chamadas e por email).
Esperar que o banco aprove o crédito.
Coordenar marcação da avaliação do imóvel com o vendedor e banco.
Esperar que o banco registe a avaliação e marque a escritura.
Finalmente, comprar uma casa representa uma saída de capital enorme! Numa casa de 200.000€, assumindo 15% de entrada, temos:
São 39.000€ que nos saem da conta de uma só vez. 39.000€ que deixamos de ter disponíveis para comprar ações, ir de férias, comprar um carro, etc. 39.000€ que nos permitem ser donos de apenas 15% da casa onde vamos viver. Dá que pensar!
Considerando uma renda igual à prestação mensal ao banco (já com seguros incluídos), alugar esta mesma casa de 200.000€ retiraria-nos um capital total inicial de 2.505€ (835€ da primeira renda + 2x 835€ de caução que são devolvidos). Não somos donos de 15% da casa, mas ganhamos o direito de a usar para nela viver, resolvendo o problema de ter onde morar por um preço mais baixo.
Custos a longo prazo
Ora bem, como podem imaginar, pedir um crédito significa obrigatoriamente que vamos ter um custo muito superior ao preço da casa. O documento que contém a proposta de crédito à habitação do banco chama-se FINE (Ficha de Informação Normalizada Europeia) e contém todos os detalhes da mesma. A melhor proposta que recebemos, na secção do montante total a reembolsar, dizia:
“Isto significa que irá pagar 2,84€ por cada Euro que pedir emprestado.”
Ou seja, pedindo emprestados 170.000€, teríamos um custo total, ao longo de 40 anos, de 482.800€ + os 39.000€ iniciais. Isto sem contar com as responsabilidades associadas ao imóvel em termos de IMI, renovações/manutenções, pagar condomínio todos os meses, etc.
Em comparação, alugar a mesma casa durante esses 40 anos, custaria 400.800€ (assumindo que a renda de 835€ não sobe). Se assumirmos que a renda sobe 2% todos os anos, alugar a mesma casa durante 40 anos, custaria 736.000€. É de loucos, não é? Para referência, nos últimos dez anos, a renda média mensal em Portugal subiu 42%1.
Nós estamos a simplificar, obviamente. Uma análise cuidada e mais realista a estes custos requer uma ferramenta mais complexa do que apenas texto para incluir os restantes fatores. Nós gostamos muito desta folha de Excel criada e apresentada neste episódio do Conversas do Karalho e inspiramo-nos nela para lançar este tema e as simulações abaixo.
Alugar só compensa se investirmos o que poupamos
Usando um cenário em que permanecemos na mesma casa durante 15 anos, acabamos por perceber, que mesmo vendendo a casa por cerca de 316.000€ no final (assumindo uma valorização anual de 3.1%), perdemos cerca de 85.000€, o que representa um custo mensal com habitação de 470€.
Este cenário é o mais pesado em termos de saída de capital inicial. Portanto, como nós já costumamos investir parte das nossas poupanças em ETFs, ficamos curiosos sobre o que aconteceria num cenário em que:
Alugamos a casa (em vez de a comprar).
Investimos aquilo que poupamos em custos iniciais (cerca de 36.000€), no S&P 500 e deixarmos a valorizar 9,9% ao ano (média dos últimos 30 anos2).
Ou seja, acabamos por escolher investir o dinheiro em ações das 500 maiores empresas americanas em vez de o investirmos numa casa. Sermos dono de partes de empresas em vez de sermos dono de uma casa. É essencialmente isto.
Ora bem, se (e este é um grande “Se”) estivermos dispostos a investir esta diferença de uma só vez no S&P 500 e esperar 15 anos sem lhe tocar (sim, é aqui que entra o efeito milagroso do juro composto), alugar traria um retorno de 1.680,80€. Ou seja, ainda seríamos pagos cerca de 9€/mês para morar naquela casa!
Claro que investir na bolsa não tem nada a ver com viver numa casa, mas pessoalmente (e financeiramente) falando, vocês percebem o que quero dizer com o “ser pago”.
Ok, então e se alugássemos a casa, mas não investissemos nada?
Bem, acho que os números falam por si. Não é nada fixe alugar apenas e não investir. Estamos a falar de um custo total em 15 anos de quase 150.000€, ou 823,75€ por mês se quiserem.
Se estiveres a ler este artigo com atenção e chegaste até aqui, de certeza que agora te estás a perguntar:
“Ok, mas então e se eu quiser comprar e investir na mesma todos os meses? Eu consigo poupar algum porque a prestação que pago banco é inferior à renda que pagaria. Não digo quase 40.000€ de uma vez, mas talvez uns 200€/mês?”.
Ainda bem que perguntaste!
Este é, sem dúvida, o cenário mais favorável de todos! Com um ganho de mais de 14.000€, é como se fôssemos pagos todos os meses 80€ para viver nesta casa e ainda sermos donos dela. Um bocado óbvio, não é? No final das contas, estamos a investir em duas coisas diferentes: um imóvel e um fundo de ações. Mau era se não fosse o cenário mais favorável.
Conclusão
Comprar uma casa e alugar uma casa são duas opções perfeitamente válidas para qualquer um. Uma dá muitas mais dores de cabeça e demora bastante mais tempo a concretizar. A outra dá-nos maior flexibilidade, menos responsabilidades e deixa-nos com mais dinheiro disponível para investir ou gastar noutras coisas.
Por mais que vos tentem dizer que uma é mais vantajosa do que a outra, o que realmente interessa é o que a decisão que tomarem vos fizer sentir.
Se olharem para a imagem abaixo, percebem que ser dono de uma casa (Apenas comprar) é mais vantajoso do que ser um inquilino (Apenas alugar). Isto porque podem vender a casa mais tarde por um valor superior.
No entanto, esse retorno pode não valer a pena todo o tempo gasto em comprar, manter e vender essa casa. Já para não falar de todo o stress causado por estas responsabilidades e a pouca flexibilidade em mudar de casa.
Por outro lado, apesar de ser possível amortizar o custo do aluguer através de um único investimento com duração de 15 anos (Alugar e investir 36.000€ uma vez), o aluguer em si sozinho (Alugar apenas) é extremamente desvantajoso financeiramente. Principalmente agora, com as rendas altas que temos em Portugal.
Bem, posto isto, o que vos quero dizer é o seguinte:
Comprem ou aluguem de acordo com a vossa situação e não com aquilo que vos disserem que é o mais correto.
Poupem e invistam de forma regular em fundos como o MSCI World Index ou o S&P 500 para beneficiarem de retornos que cobrirão os custos de comprar ou de alugar casa.
Trabalho de casa
O TPC deste artigo é extremamente simples e prático:
Abre uma conta na DEGIRO.
Transfere 200€ para a mesma.
Compra 1 ou 2 ações do Vanguard S&P 500 UCITS ETF USD.
Repete todos os meses conforme conseguires financeiramente.
Podes estar surpreendido por não dizer nada sobre correres as tuas próprias simulações e decidires comprar ou alugar com base nelas. No entanto, acredito que comprar a primeira ação num ETF que siga indíces como o S&P 500 é muito mais importante do que qualquer simulação. Porque é o hábito de investir que te ajuda a cobrir os custos, sejam eles os de comprar ou de alugar casa.
💡 Já agora! Para quem procura retornos maiores do que os do S&P 500 e gosta de analisar empresas, recomendamos o Curso de Análise de Ações da equipa do Borja on Stocks, lecionado pelo próprio César Borja.
No final das contas, aquilo que realmente interessa é agirem e começarem a pôr o dinheiro a trabalhar para vocês.
Até ao próximo artigo! ✌️
PS: O termo “alugar” foi usado de forma coloquial ao longo do texto porque pretendo que seja um artigo de fácil leitura. No entanto, semanticamente, o correto é “arrendar” porque uma casa é um bem imóvel. O termo “alugar” usa-se para bens móveis.
Disclaimer
O conteúdo deste artigo não constitui aconselhamento financeiro. Todas as informações, opiniões, e outros conteúdos são partilhados de forma informativa.
Esta newsletter é para pessoas adultas que conseguem tomar as suas decisões de investimento sem qualquer tipo de ajuda. O autor não é analista financeiro nem providencia qualquer tipo de aconselhamento individual ou de recomendações de investimentos.
Por favor, toma as tuas próprias decisões e verifica-as por ti mesmo. Analisa toda a documentação, factos e dados apresentados de forma independente.
Gostei do artigo e do exemplo mostrado, em que faz sentido a comparação das diferentes situações. O que me parece é que o dilema não é entre comprar e alugar, mas sim ter dinheiro para investir ao mesmo tempo.
Só comprar? não compensa
Só alugar? não compensa
Comprar e investir? Boa!
Alugar e investir? Boa!
Este artigo é um exercício muito útil e prático de fazer, porém pode eliminar a questão emocional na escolha.
A casa é um bem essencial e um ativo escolhido de forma muito emocional pelas pessoas, eu própria passei por isso quando comprei a minha casa, mesmo tendo conhecimento dos custos. Pegar na folha de excel é um passo que eu acho importantíssimo, falta apenas mencionar que entre alugar e comprar há os nossos valores, crenças e emoções que influenciam a decisão.
A casa é uma despesa que não se pode fugir - mesmo comprando a pronto, há toda a manutenção de viver lá. Tanto comprar e alugar têm os seus próprios custos monetários e emocionais e ninguém pode fugir a ambos quando toma uma decisão - claro que alugar a um parente ou ter um crédito habitação mais baixo facilita bastante. O que podemos dizer às pessoas é que quando alugarem ou comprarem, não se esqueçam de investir sempre, para que no futuro os custos de ter uma casa sejam relativamente inferiores aos ganhos que tenhamos dos investimentos
Acho que falta uma opção ainda mais favorável. Falo em PPR (para maximizar os benefícios, pelo menos 167€/mês), aproveitar os 400€ anuais de benefício fiscal em sede de IRS (uns incríveis 20%!! para pessoas com menos de 35 anos) e depois de alguns anos resgatar sem tributação para pagar prestações de crédito à habitação. Depois, voltar a investir o que sobrar do rendimento mensal aliviado pela "borla" na prestação. Rinse and repeat.